O polêmico projeto da terceirização

Advogado analisa os principais pontos do PL e identifica avanços e problemas

Enquanto você lê essa reportagem, pelo menos cinco pessoas sofrerão um acidente de trabalho em todo o país. Segundo a Central Única dos Trabalhadores (CUT), desse total, quatro são empregados de empresas terceirizadas, o que deporia contra o Projeto de Lei 4330/2004, que regulamenta a terceirização de mão-de-obra. Por outro lado, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) afirma que a aprovação do projeto pode significar até 3 milhões de novos postos de trabalho por ano no Brasil.

Fato é que poucos projetos de lei geraram, recentemente, tanta polêmica e opiniões divergentes quanto o PL 4330, que estava em tramitação na Câmara há 11 anos. “E, de fato, o texto apresenta aspectos positivos e negativos”, avalia o advogado Henrique Tunes Massara, sócio do escritório Cunha Pereira & Massara Advogados Associados.

“Um dos grandes avanços do PL é regulamentar uma relação de trabalho que é amplamente utilizada na iniciativa privada e que carece de uma legislação específica”, argumenta. Atualmente essa relação é regida pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que permite a terceirização de serviços de vigilância, conservação, limpeza e de serviços especializados ligados à atividade-meio do contratante.

Segundo Henrique, entretanto, o problema está exatamente em deixar a cargo do Judiciário definir o que é ou não atividade-meio. “É um conceito muito complexo. São necessários critérios objetivos para pôr fim à discussão judicial do problema”, argumenta.

O advogado cita como exemplo empresas de telefonia que foram condenadas a assinar a carteira de trabalho e pagar todos os direitos trabalhistas a empregados de companhias de telemarketing terceirizadas que prestavam serviços a essas empresas. A interpretação do Judiciário, na maioria desses casos, foi de que houve terceirização ilícita de atividade-fim.

Terceirização irrestrita

Um dos pontos mais polêmicos do PL 4330, que já foi aprovado pela Câmara e agora tramita no Senado, encontra-se no Art. 2º.

Art. 2º Para os fins desta Lei, consideram-se:

I – terceirização: a transferência feita pela contratante da execução de parcela de qualquer de suas atividades […]

II – […]

O texto elimina a diferenciação entre atividade-meio e atividade-fim, abrindo a possibilidade de terceirização irrestrita da mão-de-obra de determinada empresa. Na proposta inicial, essa medida atingiria, inclusive, a administração direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esse dispositivo, entretanto, foi suprimido do texto aprovado.

Apesar de o projeto estar parado no Senado, por motivações políticas, já houve uma sinalização de que o texto deve sofrer mudanças, impondo restrições à terceirização de algumas atividades. Henrique enxerga a medida como positiva. “De forma ampla como está, poderemos testemunhar uma infinidade de empresas de terceirização que irão surgir e desaparecer da noite para o dia. Um controle do que pode ou não ser terceirizado é importante para evitar fraudes e resguardar os direitos do trabalhador”, defende.

Por outro lado, o advogado afirma que de nada irá resolver se o projeto for alterado, mas não houver uma definição objetiva do que é atividade-fim, pois o Senado sinaliza que alterará o projeto para restringir a terceirização de algumas atividades, mas não diz se o conceito de atividade-fim será mantido. “Portanto, o texto deve prever hipóteses claras. Não adianta simplesmente retornar com os conceitos de atividade-fim e atividade-meio, pois a decisão continuará nas mãos do Judiciário, da mesma forma que já acontece”.

Responsabilidades

Segundo o PL 4330, será responsabilidade da contratante fiscalizar o cumprimento das obrigações trabalhistas decorrentes do contrato pela empresa terceirizada. Caso haja o inadimplemento, a contratante pode, inclusive, realizar a retenção de pagamentos, destinando o valor diretamente à quitação dessas obrigações.

Outra novidade é a previsão da responsabilidade solidária: quando se sentir prejudicado, o trabalhador terceirizado poderá acionar a justiça contra a empresa que o emprega e também contra a que utiliza serviços dessa terceirizada, se a empresa contratante não fiscalizar o contrato. Se houver fiscalização comprovada, mantêm-se a responsabilidade subsidiária da contratante, prevista na Súmula 331 do TST, quando a contratante só poderá ser cobrada por direitos trabalhistas de empregado terceirizado após se esgotarem os bens da empresa contratada.

Em tese, essa medida estimulará as empresas contratantes a manterem rígida fiscalização de seus prestadores de serviço. Henrique, porém, questiona até que ponto essas empresas terão condições efetivas de realizar essa fiscalização. “O empresário já precisa lidar, diariamente, com uma série de imposições e questões legais para manter seu negócio e, com isso, se criará mais uma atribuição. O problema é que, muitas vezes, a legislação é feita sem levar em conta a realidade do país”, finaliza.

Tramitação

O PL 4330/2004 ainda irá passar por quatro comissões antes de ser votado pelo plenário do Senado. Como o projeto é oriundo da Câmara, caso os senadores façam alterações no texto ele voltará à casa de origem para nova votação, em que os deputados podem manter ou derrubar as mudanças promovidas pelo Senado.

Para ter acesso ao texto do PL 4330/2004, clique aqui.