Por Raquel Tomaz Madeira de Oliveira
Com o avanço da tecnologia, o mundo vem passando por grandes transformações sociais que afetam diretamente as relações de trabalho. Não bastasse isso, com a crise mundial e as altas taxas de desemprego, tornou-se comum ver profissionais se arriscando em áreas de atuação que fogem do modelo tradicional previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, a famosa CLT.
Esses novos modelos de atuação, que colocam o trabalhador em uma condição de autônomo, divide opiniões. Alguns defendem que o formato possibilita mais flexibilidade para o prestador de serviço, seja em relação a jornada, forma de atuação e possibilidade de auferir maiores ganhos. Porém, há quem veja sob outra ótica, qual seja, a da precarização do trabalho e de direitos sociais.
Neste contexto, surgiu o chamado fenômeno da “Uberização” e consequentemente as discussões acerca da existência ou não de vínculo empregatício entre os motoristas e as plataformas de transporte por aplicativo.
Em nosso país, para que ocorra o reconhecimento de vínculo empregatício, é necessário o preenchimento dos requisitos contidos no artigo 3º da CLT, que são os seguintes: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação.
Em recente decisão, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, nos autos do processo de nº 100353-02.2017.5.01.0066, reconheceu o vínculo de emprego entre um motorista de aplicativo e a Uber do Brasil Tecnologia Ltda, já que foi firmado entendimento pela existência dos requisitos mencionados acima.
O relator do Recurso de Revista, ministro Mauricio Godinho Delgado, discorreu que a solução do caso exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, distintas do sistema tradicional, e que se desenvolvem por meio de plataformas e aplicativos digitais, softwares e produtos semelhantes, “todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais”.
Este entendimento, está longe de ser o majoritário na Justiça do Trabalho, inclusive, no caso em questão, o pedido de vínculo empregatício do autor havia sido julgado improcedente pelo TRT da 1ª Região.
Como atualmente não temos uma regulamentação que verse sobre o tema, o que temos visto ocorrer no judiciário, são decisões que, ou igualam o motorista de aplicativo a um funcionário regido pela CLT ou deixam o trabalhador sem nenhuma garantia, quando há o entendimento pela atividade totalmente autônoma e consequentemente pela inexistência do vínculo empregatício.
Penso que nenhum dos dois extremos é o caminho para a resolução da questão. O motorista de aplicativo não possui atuação idêntica a de um funcionário regido pela CLT, já que, para atuar, ele faz um cadastro na plataforma e tem liberdade para fazer a sua jornada de trabalho, inexistindo, portanto, o requisito da subordinação.
Entretanto, os profissionais que atuam neste segmento, já totalizam um número expressivo da força de trabalho a disposição da sociedade. Logo, precisam ter garantias básicas asseguradas, como por exemplo, recolhimentos previdenciários para garantia de uma renda mínima, em caso de necessidade de afastamento por doença.
O pagamento de uma espécie de acerto ao final da parceria, pelo tempo de duração da relação, semelhante ao recolhimento do FGTS para os celetistas, também seria um caminho interessante.
Fato é, que enquanto não há um consenso sobre o tema, seguimos na reflexão sobre a regulação dessa questão, sem perder de vista que a legislação e os entendimentos jurisprudenciais, devem estar atentos às mudanças ocorridas mundo a fora, possibilitando o equilíbrio entre os direitos básicos sociais dos profissionais com os interesses empresariais.