A CRIAÇÃO DE UMA STARTUP: A IMPORTÂNCIA DO CONTRATO DE PRÉ-CONSTITUIÇÃO

A CRIAÇÃO DE UMA STARTUP: A IMPORTÂNCIA DO CONTRATO DE PRÉ-CONSTITUIÇÃO

Por Fernando Landim da Cunha Pereira

Nos últimos anos, o mundo empresarial teve sua face alterada com o recente advento e considerável sucesso das startups.

Entretanto, a constituição formal de uma startup pode gerar várias dúvidas, especialmente em razão de sua natureza.

Normalmente, uma empresa é constituída mediante o arquivamento do seu ato constitutivo na Junta Comercial, quando é obtido um CNPJ e a empresa passa a existir no mundo jurídico, tendo repercussões nas mais diversas esferas do Direito, como cível, tributária e empresarial.

Contudo, esse procedimento pode ser problemático quando a empresa que se pretende constituir é uma startup.

No conceito dado pela Lei Complementar 167/2019, startup é uma empresa que visa desenvolver inovações em condições de incerteza que requerem experimentos e validações constantes.

Segundo o conceito legal, as startups podem ter natureza disruptiva, quando relacionadas à criação de algo totalmente novo, ou natureza incremental, quando visam perfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócios, de produção, de serviços e de produtos.

Além disso, merece destaque o fato de uma startup normalmente contar com uma equipe enxuta e com as distintas funções bem definidas entre seus integrantes, visando a eficiência do negócio, especialmente nas fases iniciais.

Esse modelo de negócio ainda é marcado pelo baixo investimento inicial dos integrantes. Não à toa é tão comum a participação em rodadas de investimentos e assinatura de “Contratos de Vesting”, com a finalidade de injetar dinheiro no negócio e minimizar os gastos.

Todas essas características típicas das startups podem ser empecilhos na hora de pensar em arquivar um Contrato Social antes de o negócio estar bem consolidado.

O fato de a startup desenvolver inovações em condições de incerteza e que dependem de constantes experimentos e validações sujeita seu objeto social a constantes mudanças e adaptações.

Somado a isso, o alto custo e tempo despendido em burocracia para a elaboração e arquivamento do ato constitutivo, bem como suas respectivas alterações na Junta Comercial, não são compatíveis com a incerteza de validação mercadológica típica de uma startup.

Uma solução inteligente para o problema é redigir e assinar um Contrato de Pré-Constituição, também chamado Memorando de Entendimentos.

Esse documento, por não exigir o pagamento de taxas e não ter que enfrentar um complicado processo burocrático, pode ser ideal para startups ainda em fases embrionárias.

O Contrato de Pré-Constituição, contudo, apesar de não possuir formalidades específicas, deve ser feito por advogado, tendo em vista suas particularidades e importância, inclusive, para o sucesso do negócio.

No documento, é interessante se ter, por exemplo, uma cláusula que define o projeto a ser desenvolvido, para criar maior segurança e clareza sobre o objeto da startup. A cláusula ainda deverá ter possibilidade de ser alterada mediante simples aditivos ao Memorando.

Importante também que já sejam definidas as funções e participações de cada pessoa no projeto, podendo até mesmo já serem estipuladas as quotas societárias para cada futuro sócio caso a startup tenha sucesso.

A prévia organização societária tendem a gerar mais confiança a investidores que, por se sentirem mais seguros pela menor possibilidade de conflitos e saídas repentinas de sócios, têm mais incentivos para investirem no projeto.

Outra cláusula que pode servir para aumentar a confiança de investidores e dos próprios empresários é uma que verse sobre a obrigatoriedade de constituição formal da sociedade caso determinada condição seja cumprida, como uma meta de lucros, por exemplo.

Essa cláusula poderia fixar multa em caso de descumprimento de um dos futuros sócios ou mesmo faria surgir aos sócios prejudicados o direito de pleitear em juízo o cumprimento do termo.

Por fim, é também essencial a existência de cláusula de sigilo ou não competitividade em caso de saída de um dos integrantes da startup, levando em conta, especialmente, sua natureza disruptiva ou inovadora.

Esse tipo de cláusula pode fixar um período ou mesmo uma margem geográfica, a depender de cada caso, para que a pessoa desistente não constitua uma empresa concorrente ou preste serviços para uma, bem como “vaze” informações valiosas sobre o negócio que estava em desenvolvimento.

Diversas outras situações são possíveis de serem previstas em um Memorando de Entendimentos de uma startup, o que necessita de uma análise aprofundada de cada negócio e a vontade de cada integrante.

Ademais, importante mencionar que a Lei Complementar 167, publicada em 24 de abril de 2019, alterou a Lei Complementar 123/2006 (Lei de Microempresa e Empresa de Pequeno Porte), acrescentando o art. 65-A no mencionado diploma legal.

A referida Lei Complementar cria um sistema tributário especial para as startups, denominado “Inova Simples”, e ainda cria uma forma simplificada de constituição empresarial.

Segundo a nova Lei, os titulares das empresas submetidas ao regime do Inova Simples poderiam criar a pessoa jurídica mediante simples cadastro no site Redesim, gerando um CNPJ de forma automática.

Outra inovação interessante é a possibilidade de baixa automática do CNPJ da startup mediante simples declaração da empresa de que não logrou êxito no desenvolvimento do escopo pretendido.

O cadastro pelo Redesim promete ainda a criação da empresa mediante três passos: consulta prévia, para verificar a legalidade da atividade e a existência de outras empresas com nomes idênticos; coleta de dados, etapa em que são entregues todos os documentos necessários para a constituição e recebimento de NIRE e CNPJ; e obtenção de licenças, última etapa para a obtenção do alvará de funcionamento pelo órgão regulador, em que se verifica o cumprimento de todas as exigências previstas na legislação.

Em que pese as inovações trazidas pela Lei Complementar 167/2019, parecerem boas para esse tipo de negócio, é preciso tempo para verificar como se dará o cumprimento dos dispositivos, o tempo efetivo para a criação da empresa e os custos.

Ainda que o processo de constituição de uma startup seja tão simples e desburocratizado como a lei faz parecer, tal fato não retira a necessidade de elaboração de um Contrato de Pré-Constituição, a fim de garantir não apenas sua formalização de forma mais ágil, mas também a segurança e organização necessárias aos futuros sócios e investidores, viabilizando seu sucesso.