Compliance: um novo paradigma no meio corporativo brasileiro

Lei Anticorrupção favorece implementação de sistema já consolidado em outros países

Compliance: procedimentos que buscam prevenir e punir práticas internas ilegais

Desde fevereiro deste ano está em vigor a Lei nº 12.846/13, conhecida como Lei Anticorrupção. Dentre as várias novidades trazidas pela nova legislação está o estímulo às empresas para a criação de sistemas de compliance, procedimentos internos que buscam prevenir e punir práticas internas ilegais.

Neste artigo, assinado por Gabriel Senra da Cunha Pereira e Henrique Tunes Massara, sócios do escritório Cunha Pereira & Massara Advogados Associados, os advogados exploram melhor o conceito de compliance, suas vantagens e os efeitos que sua disseminação nas empresas brasileiras podem ocasionar.

O compliance e a nova Lei Anticorrupção

Por Gabriel Senra da Cunha Pereira e Henrique Tunes Massara

A denominada Lei Anticorrupção já foi tratada neste espaço em agosto de 2013, quando sancionada pela presidente da República. Naquela oportunidade, evidenciamos os muitos problemas da nova legislação, que estabeleceu a responsabilidade objetiva – que independe de culpa ou dolo – das empresas por atos lesivos à Administração Pública.

Expusemos, também, os graves efeitos dessa responsabilização, capazes de causar verdadeiros danos à imagem e ao patrimônio das empresas supostamente envolvidas em atos de corrupção, tal como a instituição do Cadastro Nacional de Empresas Punidas e até mesmo a dissolução compulsória da pessoa jurídica.

Por outro lado, reconhecemos que, apesar das temerárias disposições, que atribuem excesso de poder ao administrador público brasileiro e enormes responsabilidades às empresas, veio a reboque um notável avanço, que é o fomento à criação de sistemas de compliance pelas pessoas jurídicas nacionais.

Os mecanismos de compliance já são previstos há muito tempo na legislação estrangeira, especialmente no Foreign Corrupt Practices Act of 1977 – FCPA norte-americano – e no britânico Bribery Act 2010. No Brasil, contudo, ainda não há uma cultura de implantação dos sistemas de compliance no meio corporativo, o que, todavia, tem se mostrado extremamente importante.

A Lei Anticorrupção, conhecida no exterior como Brazilian Clean Company Act, tratou do compliance no seu art. 7º, dispondo que será levada em consideração na aplicação das sanções “a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.

Ou seja, as empresas que, acusadas pela prática de atos de corrupção contra a Administração Pública, comprovarem possuir um sistema de compliance verdadeiro e eficiente, terão suas penalidades atenuadas. Isso porque elas demonstrarão que a prática de atos ilegais não é o modus operandi da corporação, mas, ao contrário, é desincentivada e punida internamente.

Infelizmente, neste aspecto, a legislação brasileira deixou de avançar suficientemente. Assim como acontece em outros países mais acostumados com o instituto do compliance, nossa lei deveria, em alguns casos, possibilitar até mesmo a isenção de pena das empresas que possuem bons e eficientes mecanismos de prevenção de atos irregulares.

Vale lembrar, entretanto, que os parâmetros de avaliação do compliance pelos órgãos sancionadores serão estabelecidos por regulamento do Governo Federal, o que ainda não ocorreu, apesar de a Lei nº 12.846/13 ter sido publicada em 1º de agosto de 2013 e estar em vigor desde fevereiro deste ano.

De toda forma, o fato é que o compliance já é uma realidade no ordenamento jurídico e, por que não, na cultura corporativa brasileira, devendo tornar-se objeto de atenção e cuidado dos administradores e suas organizações.

Benefícios

O compliance pode ser compreendido como um conjunto de normas e procedimentos que visa prevenir, detectar, remediar, reportar e punir efetivamente desvios de conduta ou práticas ilegais no âmbito da corporação.

Não se trata de meras normas hipotéticas e formais, existentes apenas em papéis ou códigos internos de ética e conduta da empresa. Trata-se, muito mais do que isso, de um verdadeiro sistema que se inicia com a criação e implementação de normas adequadas à realidade da companhia, passa pelo treinamento e contínua reciclagem dos colaboradores, e exige o envolvimento da Alta Administração da empresa, bem como a disponibilização de recursos financeiros e humanos autônomos na sua manutenção. É um processo cíclico, “vivo”, amplo e permanente.

Não há um único modelo adequado de compliance. Ele varia de acordo com o campo de atuação e especificidades de cada empresa, e por isso mesmo deve envolver todos os setores e atividades da corporação. É, pois, necessário que o compliance envolva profissionais de diversas áreas para sua implantação, tais como economistas, administradores, contadores e advogados, tendo em vista a abrangência da análise que será realizada na sociedade.

Implantado o modelo de compliance na atividade empresarial, é imprescindível o acompanhamento diário da aplicação efetiva do sistema, a fim de evitar que todo o trabalho se perca. O ideal é que empresas de maior porte tenham um setor específico de compliance para realizar esse acompanhamento.

Dessa forma, os benefícios do compliance vão muito além da atenuação das sanções eventualmente impostas às pessoas jurídicas enquadradas na Lei Anticorrupção. Ele serve, de fato, a tornar a empresa ainda mais competitiva.

Um sistema de compliance efetivo abre novos mercados, pelo notável compromisso de cumprir a legislação nacional e internacional; atribui credibilidade, por dar efetividade aos valores e princípios éticos da corporação; e confere segurança e estabilidade jurídicas aos administradores, colaboradores e parceiros, porque minimizam os riscos de suas atuações. Há diversas corporações que, por exemplo, utilizam como critério de contratação a existência de mecanismos de compliance no âmbito de seus fornecedores.

Há, ainda, estudos que garantem que o retorno financeiro para a corporação é até cinco vezes superior ao gasto com a implantação e manutenção de bons e eficientes programas de compliance, em decorrência das vantagens acima mencionadas. [1]


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