Falta de critérios em licitações expõe Administração a riscos
A cena é corriqueira, especialmente nessa época de fim de ano: você entra em uma loja e vê um produto sendo vendido a um determinado preço. Sai e, logo na calçada, encontra um produto “similar” pela metade do valor. Difícil resistir, não é? Pois você não é o único nesta situação. Segundo pesquisa recente da Fecomércio/RJ, um em cada três brasileiros consome produtos piratas. É por isso que o Brasil instituiu, em 2005, o Dia Nacional de Combate à Pirataria, celebrado anualmente no dia 3 de dezembro.
O problema, porém, vai muito além da esfera das compras individuais e atinge também o setor público. Em 2012, a Defesa Civil da cidade do Rio de Janeiro contratou, via licitação, uma empresa de envio de SMS para atender o Alerta Rio – programa que emite comunicados de chuvas por mensagem de celular a agentes comunitários, visando evitar mortes em deslizamentos ou alagamentos. Quando a Defesa Civil precisou do serviço, entretanto, ele falhou, e só então se descobriu que o contrato havia sido firmado com uma empresa de “SMS pirata”.
“A Administração simplesmente não se atenta a esse problema nas compras governamentais. Assim como qualquer pessoa pode ser vítima da pirataria, o governo também está sujeito”, afirma o advogado Gabriel Senra da Cunha Pereira, sócio do escritório Cunha Pereira & Massara Advogados Associados. Segundo Gabriel, existem dispositivos legais que permitem e, sobretudo, determinam que a Administração deve se precaver desse risco. “Porém, devido à regra geral da legislação de licitações, principalmente no que tange aos pregões, o governo acaba confundindo os conceitos de menor preço e mais barato, sem estabelecer critérios mínimos de qualidade do produto ou serviço licitado”, explica.
Uma das soluções para o problema seria a elaboração de projetos ou termos de referência mais detalhados, que apresentem todas as especificações do produto ou serviço que está sendo licitado, com inclusão de critérios objetivos de rendimento, produtividade, segurança e procedência, dentre outros. Outro mecanismo para evitar que empresas ofertem e vençam licitações públicas com produtos piratas é a verificação prévia, por parte do ente licitante, da compatibilidade dos valores apresentados pelos concorrentes com o preço de custo e de mercado daquele produto. “A Administração não pode ser uma aliada da concorrência desleal”, defende Gabriel. “Quando o governo deixa de tomar os devidos cuidados, ele sai da condição de vítima e passa a contribuir para a prática de atos ilegais”, complementa.