Juíza dá ganho de causa a hospital que contrata médicos por meio de PJ
Uma decisão proferida pela juíza do Trabalho Katia Bizetto, da 62ª Vara de São Paulo “colocou mais lenha na fogueira” do debate sobre os limites da terceirização. Em julgamento de ação movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) a magistrada reconheceu a legalidade das contratações de médicos como Pessoa Jurídica pelo Hospital Sírio-Libanês. O MPT alegava que o hospital estaria realizando a terceirização de atividade-fim, promovendo a chamada “pejotização”, o que é vedado por lei.
Em sua defesa, o Sírio-Libanês afirmou que as finalidades máximas da instituição, segundo seu contrato social, são a manutenção de leitos e serviços hospitalares para atendimento ao público e o fomento de estudos e pesquisas nas áreas médica e de saúde. Dessa forma, portanto, a contratação de médicos como PJ não se enquadraria como terceirização de atividade-fim.
O hospital também defendeu que os requisitos para reconhecimento de vínculo empregatício não se aplicavam, uma vez que não pratica qualquer ato de ingerência, fiscalização ou controle das atividades desempenhadas pelos médicos.
Apesar de discordar da defesa e atestar que os serviços médicos são, sem dúvida, a atividade-fim do hospital, a juíza afirmou não ser possível caracterizar a intermediação ilegal de mão de obra “por inexistir qualquer manifestação de vontade dos médicos para que a vinculação seja na forma de vínculo de emprego, ao contrário. Todos os médicos da instituição ré, quer por declarações próprias, quer através dos representantes das sociedades das quais são sócios, afirmaram de forma categórica que não têm interesse no reconhecimento da condição de empregados […]”.
Em sua decisão, a magistrada ainda afirmou não reconhecer nenhum traço de subordinação na relação entre os profissionais e o hospital e que também deve ser considerado o fato de que, como PJs, os médicos auferem ganhos superiores aos que perceberiam na condição de empregados. “Não se pode dizer, portanto, que a terceirização de atividade-fim, como único fator, importa em fraude […]”, concluiu.
Considerações sobre a decisão
Na visão do advogado Henrique Tunes Massara, sócio do escritório Cunha Pereira & Massara Advogados Associados, “o fato de não haver manifestação de vontade dos médicos em alterar o regime de contratação pouco importa. O que deve ser analisado é se há ou não a relação de vínculo de emprego”, pondera.
O fundamento de que inexiste entre os médicos e o hospital qualquer relação de subordinação também é algo que normalmente não ocorre nos hospitais, pondera Henrique. “Ainda que sejam duas ou três vezes por semana, obviamente é exigido do profissional o cumprimento de uma carga horária mínima, além da necessidade de uma escala de plantões que se impõe a qualquer instituição de saúde. Além disso, em regra, o médico é subordinado a outro profissional responsável por determinada especialidade e aos diretores da entidade hospitalar.”
O advogado afirma que a “pejotização” pode se configurar como uma fraude ao Fisco, uma vez que não há recolhimento de impostos decorrentes da relação de emprego. “O profissional pode até receber um pouco mais, mas não tem direito a nenhum benefício trabalhista”, alerta.
O advogado alerta, ainda, que “a análise da sentença deste processo é superficial, pois não foi possível o acesso às provas produzidas nos autos. Na verdade, as ponderações relatadas apenas refletem a realidade dos médicos brasileiros, mas não o caso específico, sendo certo que as convicções da sentença devem ser respeitadas”.
Por fim, ressalta-se que em uma ação individual semelhante ao caso ora debatido, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região decidiu de forma diferente. Uma médica, após trabalhar como PJ por quase quatro anos em um hospital de São Paulo, acionou a Justiça do Trabalho buscando o reconhecimento da relação empregatícia. O pedido foi negado em primeira instância, mas a decisão foi reformada por Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho.