SAÚDE DIGITAL – DESAFIOS DA LEI X OPORTUNIDADES

Por Henrique Tunes Massara


Segundo levantamento do Instituto Insper[1], os investimentos de risco na indústria global de saúde digital atingiram quase 45 bilhões de dólares em 2021 com o impulsionamento da pandemia da COVID-19, o dobro do ano anterior e a maior quantia desde 2010.

Em 2022, no entanto, o montante investido caiu pela metade, para 23,3 bilhões de dólares, embora ainda tenha sido a segunda maior cifra anual no período analisado.

Quando se fala em utilização de tecnologia nos serviços da área de saúde é cada vez mais frequente, pois com a COVID-19 se exigiu uma adaptação urgente das condutas e protocolos em hospitais e consultórios médicos para se evitar a disseminação do contágio.

Um segmento que cresceu consideravelmente é o chamado mHealth, abreviação de mobile health, ou saúde em dispositivos móveis, em português. Segundo o Instituto Insper[2], no Google Play Store, durante o último período analisado, foram encontrados mais de 54 mil aplicativos de saúde e medicina disponíveis, uma pequena queda em comparação com o trimestre anterior. No entanto, entre o início de 2020 e o final de 2021, o número de aplicativos de saúde móvel disponíveis para usuários do Android aumentou, chegando a mais de 65 mil no último trimestre de 2021.

Já na Apple App Store, havia mais de 41 mil aplicativos mHealth disponíveis no último período observado, uma diminuição de 20% em relação ao trimestre anterior. Em 2020, o número de aplicativos de saúde móvel disponíveis para usuários do iOS continuou a crescer e, no primeiro trimestre de 2021, atingiu o pico de quase 54 mil aplicativos.

Portanto, a evolução considerável dos meios tecnológicos nos serviços de saúde exigiu também que se aprimorasse a regulação sobre o tema, que foi capitaneada pelo início da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados em setembro de 2020.

Somado a isso, tivemos regulação específica do setor de saúde com a Lei 13.989/2020 (Uso de Telemedicina na Pandemia) posteriormente revogada pela Lei 14.510/2022 que veio disciplinar a prática da telessaúde no Brasil.

A telessaúde é a modalidade de prestação de serviços de saúde à distância, por meio da utilização das tecnologias da informação e da comunicação, que envolve, entre outros, a transmissão segura de dados e informações de saúde.

Outra regulamentação relevante foi a Estratégia da saúde digital editada pela PORTARIA GM/MS nº 3632, que define a implementação até o ano de 2028 da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), para que seja estabelecida e reconhecida como a plataforma digital de inovação, informação e serviços de saúde, em benefício de usuários, cidadãos, pacientes, comunidades, gestores, profissionais e organizações de saúde.

Os objetivos previstos neste documento são importantes para a implantação de políticas públicas essenciais para a evolução da prática segura dos serviços de saúde com a utilização da tecnologia, quais sejam: (i) modelo de governança por meio do Comitê Gestor de Saúde Digital (CGSD); (ii) Implementação de políticas de informatização dos sistemas de saúde nos três níveis de atenção, (iii) promover a partir da RNDS o suporte às melhores práticas clínicas (APLICATIVOS), (iv) promover o engajamento de pacientes e cidadãos a praticar hábitos saudáveis; (v) formação e capacitação de profissional de Informática em Saúde; (vi) trabalho colaborativo em todos os setores da saúde para que tecnologias, conceitos, padrões, modelos de serviços, políticas e regulações sejam postos em prática; e (vii) ecossistema de inovação que aproveite ambiente de interconectividade em saúde.

E podemos citar ainda a Portaria GM/MS nº 1.768, revisão PNIIS, cujo objetivo é definir os princípios e diretrizes norteadores para os setores público e privado efetivarem a integração dos sistemas de informação em saúde.

Por fim, a Emenda Constitucional 15/2022, que definiu que a proteção de dados é um direito fundamental do cidadão e envolve competência privativa da União para legislar sobre o tema, o que demonstra a relevância do assunto para o nosso país.

Toda essa preocupação com a regulação da saúde digital tem fundamento no grande volume de tráfego de dados sensíveis, que possuem proteção especial na Lei Geral de Proteção de Dados.

Com a evolução da tecnologia, esse tipo de dado fica exposto em grande volume, pois existem gigantescos bancos de dados (Big Data) que usufruem do uso de inteligência artificial com seus misteriosos e imperfeitos algoritmos.

E imaginemos o elevado risco envolvido no tráfego dos dados sensíveis nos serviços de saúde, como, por exemplo, em condutas que envolvam registros fotográficos de pacientes por celular para envio em grupo de profissionais, registro de procedimento para troca de plantão, uso de equipamentos médicos com inteligência artificial.

Segundo o professor Fernando Aith[3], não se pode esquecer também dos dispositivos laboratoriais de diagnóstico na nuvem de dados digitais para laudos diagnósticos conclusivos, dispositivos médicos capazes de realizar anamnese, diagnóstico e, ainda, fazer uma proposta terapêutica para o paciente e os aplicativos de internet que captam dados sensíveis das pessoas para prescrição de dicas de comportamento no campo da saúde física e mental.

Por outro lado, o aspecto positivo do uso da tecnologia e inteligência artificial supera e muito os pensamentos pessimistas mais conservadores, pois não haverá retorno quanto ao aprimoramento e utilização destas ferramentas nos serviços de saúde.

Isso porque os benefícios do uso de dados dos pacientes com as devidas cautelas da LGPD gera facilidade do acesso e qualidade na consulta, principalmente em casos de emergência e permite interação das informações dos medicamentos utilizados, o que evita que um médico prescreva algum medicamento contraindicado ao paciente.

Diante desse cenário, cabem aos hospitais, consultórios, clínicas médicas e empresas do ramo da saúde a adequação às diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados mediante um diagnóstico adequado sobre riscos de descumprimento com estabelecimento de uma política de proteção, criação de padrões de segurança de Tecnologia da Informação e treinamento sobre os cuidados que seus colaboradores devem ter para não violar as normas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LGPD na saúde digital/Fernando Aith e Analluza Bolivar Dallari, coordenação. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022

Aith, Fernando. LGPD na saúde digital/Fernando Aith e Analluza Bolivar Dallari, coordenação. Fundamentos e Desafios da Regulação da Saúde Digital em Estados Democráticos de Direito – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022

https://www.insper.edu.br/noticias/investimentos-na-industria-de-saude-digital-encolhem-no-mundo/

[1] https://www.insper.edu.br/noticias/investimentos-na-industria-de-saude-digital-encolhem-no-mundo/

[2] https://www.insper.edu.br/noticias/investimentos-na-industria-de-saude-digital-encolhem-no-mundo/

[3] Aith, Fernando. LGPD na saúde digital/Fernando Aith e Analluza Bolivar Dallari, coordenação. Fundamentos e Desafios da Regulação da Saúde Digital em Estados Democráticos de Direito – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022